quarta-feira, 2 de março de 2011

Espaço em que se pensa


O espaço é um fenômeno da consciência, um estado do espírito, uma questão de opinião, como tenta demonstrar rapidamente Riobaldo:

"O senhor tolere, isto é o sertão. Uns querem que não seja: que situado sertão é por os campos-gerais a fora a dentro, eles dizem, fim de rumo, terras altas demais do Urucúia. Toleima. Para os de Corinto e do Curvelo, então, o aqui não é o dito sertão? Ah, que tem maior! Lugar sertão se divulga: é onde os pastos carecem de fechos, onde um pode torar dez, quinze léguas, sem topar com casa de morador; e onde criminoso vive seu cristo-jesus, arredado do arrocho de autoridade. O Urucúia vem dos montões oestes. Mas hoje, que na beira dele, tudo dá - fazendões de fazendas, almargem de vargens de bom render, as vazantes; culturas que vão de mata, madeiras de grossura, até ainda virgens dessas lá há. O gerais corre em volta. Esses gerais são sem tamanho. Enfim, cada um o que quer aprova, o senhor sabe: pão ou pães, é questão de opiniães... O sertão está em toda a parte", JGR, GSV, p. 23-24, 19a. Ed. Nova Fronteira.

Primeira negativa que desmonta a construção de que a ideia se forma apenas a partir do objeto. A coisa está lá e intima os sentidos do observador a apreendê-la, mas desse movimento nasce a consciência criadora de sentidos, sentidos estes que darão sentido, depois, à própria consciência, agora transcendida. Anoto: a) primeiro a intimação da linguagem (a simulação da conversa: narrador-narratário; escritor-leitor); b) depois a subversão da lógica da direção (inversão do sentido da construção da imagem-ideia); c) por fim, a coisa já não pertence ao mundo, que agora está suspenso (o que existe é o fenômeno, que passa a existir, ou seja, é lançado para fora de si, seguindo o mesmo movimento da consciência, que só existe quando se projeta na produção de sentidos que são próprios, formando opiniões e nominando).

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