“Assim, a
casa evocada por Bosco vai da terra para o céu. Tem a verticalidade da torre,
elevando-se das mais terrestres e aquáticas profundezes até a morada de uma
alma que acredita no céu. Tal casa, construída por um escritor, ilustra a
verticalidade do humano. E é oniricamente completa. Dramatiza os dois pólos dos
sonhos da casa. Faz a caridade de uma torre àqueles que talvez não tenham
conhecido sequer um pombal. A torre é obra de outro século. Sem passado, ela
nada é. Que coisa ridícula é uma torre nova! Mas os livros aí estão para dar
mil moradas aos nossos devaneios. Na torre dos livros, quem não viveu suas
horas românticas? Essas horas retornam. O devaneio tem necessidade delas. No teclado
de uma vasta leitura ligada à função de habitar, a torre é uma nota para os
grandes sonhos. Quantas vezes, depois de
ter lido l`antiquaire, fui habitar a
torre de Henri Bosco!
“A torre e
os subterrâneos de além-profundezas alongam nos dois sentidos da casa (...) Para
nós, essa casa é uma ampliação da verticalidade das casas mais modestas que,
para satisfazer aos nossos devaneios, também têm necessidade de diferenciar-se em
altura. Se tivéssemos de ser o arquiteto da casa onírica, hesitaríamos entre a
casa de três e a de quatro andares. A casa de três andares, a mais simples com
referência à altura essencial, tem um porão, um pavimento térreo e um sótão. A
casa de quatro pavimentos coloca um andar entre o pavimento térreo e o sótão.
Um andar a mais, um segundo andar, e os sonhos se embaralham. Na casa onírica,
a topoanálise só sabe contar até três ou quatro.
“Entre o um
e o três ou quatro estão as escadas. Todas diferentes. A escada que conduz ao
porão, descemo-la sempre. É a descida
que fixamos em nossas lembranças, é a descida que caracteriza o seu onirismo. A
escada que sobe até o quarto, nós a subimos e descemos. É um caminho mais
banal. É familiar.
“(...) a escada
do sótão, mais abrupta, mas gasta, nós a subimos
sempre. Ela traz o signo da ascensão para a mais tranquila solidão. Quando
volto a sonhar nos sótãos de antanho, não desço jamais.
“A
psicanálise descobriu o sonho da escada. Mas, como tem necessidade de um
simbolismo globalizante para fixar sua interpretação, deu pouca atenção à
complexidade das misturas do devaneio com a lembrança. Eis por que, neste ponto
como em outros, a psicanálise está mais apta a estudar os sonhos que os
devaneios. A fenomenologia do devaneio pode deslindar o complexo de memória e
imaginação. (...) Por vezes, alguns degraus inscreveram na memória um pequeno
desnivelamento da casa natal”.
GASTON BACHELARD, em A poética do espaço. Martins Fontes,
2002, p.43-4.
“Dentro de cada pessoa
ResponderExcluirTem um cantinho escondido
Decorado de saudade
Um lugar pro coração pousar
Um endereço que freqüente sem morar
Ali na esquina do sonho com a razão
No centro do peito, no largo da ilusão”
a casa é o cantinho escondido, escondido exatamente porque é dentro, o lugar importa menos do que o valor de intimidade dado ao lugar, que na verdade pode ser qualquer lugar. Por isso a casa onírica, o cantinho no mundo, nós carregamos sempre conosco, pois é nosso corpo e alma.
“Eu posso até mudar
Mas onde quer que eu vá
O meu cantinho há de ir”
http://www.youtube.com/watch?v=egMte_w0blk
Beijo
Como é atenta, você, Margoh.
ExcluirSó tenho que agradecer a você por enriquecer este humilde espaço com tão preciosas contribuições que deixa aqui.
Obrigado.
Receba um grande abraço.
Gilson.
:)
ExcluirHola, te mando un saludo desde Madrid
ResponderExcluirHola, Maria De los Ángeles de Madrid.
ExcluirSaludos desde Brasil.
Gracias por visitar y veo que sigues a este simple espacio, gracias también por esto.
Abrazo.
Gilson.
Ciao, che sofferenza leggere e capire solo spezzoni di testo...(e, come già detto, la traduzione aiuta ben poco) ma, se vogliamo essere anche un po' filosofi, tanti spezzoni uniti hanno comunque il loro fascino e anche se
ResponderExcluirnon si arriva dove la strada maestra voleva portarti, ci si immerge in un dedalo di strade secondarie!
Ciao, ciao, Floriana
Ciao, Floriana.
ExcluirNão sei se pode imaginar a satisfação que me proporciona receber suas visitas e comentários, enfrentando todas as dificuldades da diferença dos idiomas. Vou deixar você com o Google e o meu português.
Muito obrigado pela visita, pelo esforço da leitura e pelo belo comentário.
Abraço.
Gilson.
Gilson, la arquitectura y sus formas simbolizan y acotan espacios. Espacios de vida. Filosofías y pensamientos racionales o religiosos. Cada época tiene su lenguaje y sus claves que también se materializa en las edificaciones. La escalera es un metáfora, sin duda, de múltiples significados.
ResponderExcluirInteresante reflexión sobre el espacio y sus formas
Abraços
Hola, Felicidad.
ExcluirYo pienso que la materia de la memoria es espacial, no temporal. Nuestras lembranzas son hechas de espacios vividos, como enseña Bachelard. Tengo los libros (y toda expreción de la arte) como formas espaciales, que tenemos que traversalas... Siento falta de palabras para mehor expressarme.
Gracias por tu maravilloso comentario.
Abrazo.
Gilson.
Ola Imaginario Gilson, me gusta el pasaje de este escritor que e magico e onirico.
ResponderExcluirBeijo.
Boa noite, Carolina.
ExcluirBom vê-la aqui. Seja bem-vinda sempre.
Bachelard é um dos meus guias (fundamento teórico).
Abraços.
Gilson.