quinta-feira, 14 de abril de 2011

O Sortilégio da mariposa I - As Personagens


O Sortilégio da mariposa
(Comédia em dois atos e um prólogo)

Federico García Lorca (1919)

Personagens

Dona Barata, Barata Nigromântica, Baratinha Sílvia, Dona Orgulhos (mãe da Baratinha Sílvia), Mariposa, Baratinho (o Nenen, filho de Dona Barata), Lacrauzito (o Corta-Vimes), 1º Vagalume, 2º Vagalume, 3º Vagalume, 1ª Barata Camponesa, 2ª Barata Camponesa, Outras Baratas Camponesas, Baratas Guardiãs, Barata Santa.

sábado, 9 de abril de 2011

Yerma XII - acto tercero, cuadro segundo


Géia mata Uranos, seu próprio filho
Primeira indicação cênica: (Alrededores de uma ermita, en plena montaña. En primer término, unas ruedas de carro y unas mantas formando una tienda rústica donde está Yerma. Entran las mujeres conofrendas a la ermita. Vienen descalzas. En escena está la vieja alegre del primer acto). (Canto a telón corrido.). O quadro final da pela se desenrola na montanha, nas proximidades de uma morada. A casa do santo, onde se realiza a romaria das casadas sem filhos. Profano e sagrado se misturam. Dominam a sequência duas "máscaras" populares: o macho e a fêmea. Toda a figuração gira em torno de um erotismo que busca ligar céu e terra e devolver a fecundidade aos homens. Segunda indicação cênica: (Entran. Salen muchachas corriendo, con largas cintas en las manos, por çla izquierda. Por la derecha, otras tres mirando hacia atrás. Hay en la escena como un crescendo de voces y de ruidos de cascabeles y colleras de campanilleros. En un plano superior aparecem las siete muchachas que agitam las cintas hacia la izquierda. Crece el ruido y entram dos máscaras populares. Llevan grandes caretas. El macho empuña un cuerno de toro en la mano. No son grotescas de ningún modo, sino de grand belleza y con un sentido de pura tierra. La hembra agita um collar de grandes cascabeles. El fondo se llena de gente que grita y comenta la danza. Está muy anochecido). A Velha faz a revelação crua a Yerma: Juan é estéril e jamais lhe dará filhos. Oferece em seguida que procure outro homem: o próprio filho da Velha. Yerma o nega em nome de sua honra. Juan, que estava no lugar, espreitando, ouve a conversa e tenta convencer Yerma que podem ser felizes sem filhos. Yerma o mata, asfixiando-o. Toda a sequência é como que conduzida pelas indicações cênicas. A última: (Yerma da um grito y aprieta la garganta de su esposo. Este cae hacia atrás. Le aprieta la carganta hasta matarle. Empieza el coro de la romería.). (Se levanta. Empieza a llegar gente.). (Acude un grupo que queda al fondo. Se oye el coro de la romería).

Imagem: Google images (efestodoolimpo.blogspot.com)

quinta-feira, 7 de abril de 2011

Yerma XI - Acto tercero, cuadro primero


O Fundo
Dolores, Yerma e mais duas velhas passaram a madrugada em orações num cemitério. Yerma vive momentos de grande excitação e esperança. Ao amanhecer, repassa todos os procedimentos necessários e as orações a serem feitas, mas ao preparar-se para sair e voltar para sua casa, Juan a descobre ainda na casa de Dolores. Yerma recebe acusações duríssimas sobre desonra da família de Juan, que insinua que estivesse na presença de outros homens. Yerma responde à altura, mesmo aos gritos, em defesa de sua própria honra e de sua família. Clama pelas "chaves" de sua vida e relaciona Juan "aos muros" que a impedem de exercer sua vida em liberdade e felicidade. Se, por um lado, somente Juan pode lhe dar filhos (segundo seu código de honra), e se, por outro, este não lhos dá, o desfecho trágico está preparado. Yerma só se sairá derrubando o "muro", matando Juan, ou seja, sua única posibilidade moral de ter um filho.

Imagem: Google images (poemasquefluemdo.blogspot.com).

Yerma X - Acto segundo, cuadro segundo


A Descida
Este quadro prenuncia La Casa de Bernarda Alba, pois inicia-se um processo de "ilhamento" da casa de Juan. O marido utiliza suas duas irmãs para vigiar fisicamente os passos de Yerma, e de sua posição de marido para fechá-la em casa, tudo em nome da honra da família. Nem precisava: Yerma se sente água represada e inútil; além de já presa à sua própria honra de casta, que a impede de até mesmo pensar em ter filhos com um homem que não seja seu marido. Renega, pois, os conselhos da Velha, de relativizar os laços do matrimônio. Mas a figura do marido aparece como "pão" e "abrigo". O diálogo entre o casal está impossível e, por fim, interditado. Mas, em que pese Yerma já não poder dormir, sonha com o filho que ainda não tem. Não sente inveja daquelas que os têm, mas se sente pobre por não os ter. "Acabaré creyendo que yo misma soy mi hijo".  Dolores, a curandeira, está esperando-a. Victor vende suas ovelhas a Juan (que as dá de presente a Yerma) e se muda para outro lugar. Ter marcado a consulta com Dolores mostra o ânimo de Yerma em ir ao encontro de seu destino. Trabalhar, fazer o que  sempre esperou do marido: "El fruto viene a las manos del trabajador que lo busca".  Claro que se referindo à vontade para ter filhos. Logo que se despedem de Víctor, Yerma sai para se encontrar com a curandeira. As cunhadas percebem o movimento e saem à procura de Yerma. O cenário está escuríssimo.

Imagem: Google images.

Yerma IX - Acto segundo, cuadro primero


O Coro da Lavadeiras
Elemento da tragédia, o coro funciona como um narrador, com suas múltiplas possibilidades funcionais. No primeiro quadro do segundo ato de Yerma estamos diante da onisciência narrativa na forma de "voz do povo". Todo o drama que vive Yerma é do conhecimento do povo do lugar e nos é transmitido pela canto da lavadeiras. Nem sempre efetivamente cantado, diga-se, mas com a mesma função de nos dar conta de tudo que se passa: do que é de conhecimento de Yerma e também do que não é. Muitos juízos de valor são emitidos com a autoridade que tem "a voz do povo", até porque 'falar não é pecado', em que pese a maledicência solta como a água descendo a serra.
a) Juan levou suas duas irmãs para morar com ele e Yerma na mesma casa;
b) Essas cunhadas são flores de cemitério, dão medo;
c) Yerma gosta de ficar na rua porque lhe custa permanecer em casa;
d) Yerma se comporta como os homens;
c) A culpa por não ter filhos não é de Yerma;
d) Mulheres como Yerma não querem ter o corpo deformado pela gravidez;
e) Yerma se enfeita para procurar outro homem, que não é seu marido;
f) Yerma foi vista duas vezes com outro homem;
g) Yerma olha para as pernas desse outro homem;
h) Quando Yerma não o olha pessoalmente, tem sua imagem fixada nos olhos;
i) Juan está surdo, parado como um lagarto ao sol;
j) Nada disso teria importância se tivessem filhos, Yerma e Juan;
k) Isso acontece com gente que não se conforma com seu destino;
l) A casa de Juan está prestes a explodir;
m) De Juan é a culpa: não se podendo dar filhos é preciso cuidar da mulher;
n) A culpa é de Yerma, porque é dura como o sílex;
o) O simples soar do nome "VICTOR" desperta a atenção das cunhadas;
p) Ai da casada seca;
q) É preciso juntar flor com flor no verão (tempo da seca);
r) É preciso gemer; é preciso cantar;
s) É preciso agradecer o homem que traz pão e flor;
t) A submissão é fonte da fecundidade;
u) Que a casada seca volte a brilhar; que cante; que volte a cantar;

domingo, 3 de abril de 2011

Yerma VIII - O Mito de Perséfone

O Regresso de Perséfone

Perséfone, bela donzela, era filha da deusa da colheita, Deméter. A bela jovem ajudava sua mãe a manter o fogo sagrado. As duas viviam em grande paz  e felicidade, de modo que eram grandes amigas.
Com muitos pretendentes, contudo, Hades, o deus dos infernos, ao avistar a doce Perséfone, caiu de amores pela jovem. E rasgando as entranhas da terra, veio à superfície com sua negra carruagem e raptou Perséfone, levando-a para morar com ele no submundo.
Deméter se pôs a chorar e muito triste não teve mais vontade de cultivar a terra. Houve então que nessa época a humanidade passou por um grande período de seca e infertilidade do solo. As pessoas não tinham mais o que comer e iniciou se uma época de grande fome.
Zeus, compadecido da pobre mãe e da situação dos mortais, pediu a seu  irmão que devolvesse a menina à deusa.
Hades, gostando imensamente da companhia de Perséfone e nem um pouco inclinado a devolvê-la, usou de um estratagema respondendo: "Sim, ela pode voltar a morar com a mãe, desde que daqui do submundo nada tenha ingerido", sabendo  de antemão que sua amada já havia ingerido uma romã e, assim, não precisaria devolvê-la.
Deméter então se pôs a chorar lágrimas de  grande dor e, compadecido ao ver a sogra, Hades fez o seguinte acordo: Perséfone passaria seis meses com ele e seis meses com a mãe.
Não tendo outro jeito, Deméter aceitou o acordo. De forma que até hoje, quando Perséfone desce aos infernos para ficar com seu esposo, sua mãe entra em grande tristeza e deixa de cultivar a terra, e entramos então no outono e inverno. Ao retornar, a alegria de Deméter é tanta que retorna a cultivar o solo, e iniciam-se a primavera e o verão. Tempo de cultivo e renascimento.
____
Não tem jeito, Yerma atualiza Perséfone e estamos diante de um drama agro-lunar? Ao anotar, nas primeiras indicações cênicas, que Yerma desperta com uma "alegre luz de manhã de primavera", Lorca nos diz que um novo ciclo começa: Yerma cultivará e fecundará. Vamos arrumar um jeito de dizer isso nos termos teóricos, inventariando os mitemas da constelação do mito, pelas imagens do regime noturno sintético. Ah, vamos, mas, primeiro, vamos estudar a) o drama agro-lunar e o mito de Perséfone.

Imagem: Google images (paideia.blog.br).

Mircea Eliade I - "A Lua e a mística lunar"


"A Lua e o tempo.
"O Sol permanece sempre igual, sem qualquer espécie de 'devir'. A Lua, em contrapartida, é um astro que cresce, decresce e desaparece, um astro cuja vida está submetida à lei universal do devir, do nascimento e da morte. Como o homem, a Lua tem uma 'história' patética, porque a sua decrepitude, como a daquele, termina na morte. Durante três noites o céu estrelado fica sem lua. Mas esta 'morte' é seguida de um renascimento: a 'lua nova'. O desaparecimento da Lua na obscuridade , na 'morte', nunca é definitivo. Segundo um hino babilônico dirigido a Sin, a Lua é 'um fruto que cresce por si mesmo'. Ela renasce da sua própria substância, em virtude do seu próprio destino.
"Este eterno retorno às suas formas iniciais, esta periodicidade sem fim fazem com que a Lua seja, por excelência, o astro dos ritmos da vida. Não é, pois, de surpreender que ela controle todos os planos cósmicos regidos pela lei do devir cíclico: águas, chuva, vegetação, fertilidade. As fases da Lua revelaram ao homem o tempo concreto, distinto do tempo astronômico, que só posteriormente foi descoberto. O sentido e as virtudes mágicas das fases da Lua eram já definitivamente conhecidos na época glaciária. Encontramos o simbolismo da espiral, da serpente e do raio - derivados todos da intuição da Lua considerada como norma da mudança rítimica e da fertilidade - nas culturas da região glaciária da Sibéria. O tempo concreto era, sem dúvida, medido por meio das fases da Lua. E, ainda nos nossos dias, certos povos nômades que vivem da caça e da recolecção (Jaeger-und Sam mlervölker) só utilizam o calendário lunar. A mais antiga raiz indo-ariana relativa aos aos astros é a que designa a Lua: é a raiz me, em sânscrito mâmi, 'eu meço'. A Lua é o instrumento de medida universal. Toda a terminologia relativa à Lua nas línguas indo-europeias deriva desta raiz: mâs (sânscrito), mâh (avéstico), mah (velho prussiano), menu (lituano), mêna (gótico), méne (grego), mensis (latim). Os germanos mediam o tempo segundo a noite. Vestígios desta medida arcaica encontram-se ainda nas tradições populares europeias: certas festas são celebradas de noite, como por exemplo, a noite Natal, de Páscoa, de Pentecostes, de S. João, etc.", Mircea Eliade, Tratado de história das religiões, p.127-128.

Imagem: Google imagens (reflectmeyself.blogs.sapo.pt).

Yerma VII - Acto primero, cuadro segundo


Yerma vai levar comida ao marido no campo e se encontra com a Velha. Angustiada e querendo explicações para o fato de ainda não ter se engravidado, mesmo depois de mais de 2 anos de casamento, questiona insistentemente a Velha, suplica uma explicação, que a outra deve ter, por causa da experiência. A Velha não quer falar, tenta não falar, mas pede menos ingenuidade e insinua que Juan não pode ter filhos ("homem de semente podre"). Yerma reclama que não entende o que a Velha diz. A velha se vai. Conversa com as duas moças, a primeira, com filhos e preocupada com eles, a segunda não os tem e nãos os quer ter (casou-se por obrigação da família). Esta última é filha de Dolores, mulher que conhece remédios contra a pouca fecundidade das mulheres e que Yerma pretende procurar. Encontro com Victor, que vinha cantando ("a sua voz era como um jorro de água", cantando). Yerma devaneia ou delira, como que escutando choro de bebê. Há uma troca de olhares. Entra Juan. Sai Victor. Juan repreende a demora da esposa em voltar para casa. Yerma volta para casa: ela dormirá, enquanto Juan permanecerá toda a noite na roça, protegendo a água dos regadores. "Velando pela água". Água real e água simbólica. Os ladrões roubam a água real de Juan; o destino rouba a água simbólica da fecundidade de Yerma. Por isso ela dormirá: Juan sabe quem o pode roubar a água; a vigília de Yerma não a ajudaria em nada, pois não sabe contra quem luta. Ainda: dormindo, poderá voltar a sonhar com o pastor com o bebê nos braços. A romã de Yerma é sua entrega ao marido, cumprindo sua vocação e seu desejo de cultivar a humanidade.

Imagem: Google images (tela de Ademir Martins).