domingo, 10 de março de 2013

João: Minas e a vida.



ALONGO-ME

O rio nasce
toda a vida.
Dá-se
ao mar a alma vivida.
A água amadurecida,
a face
ida.
O rio sempre renasce
A morte é vida”.

JOÃO GUIMARÃES ROSA, Jornal O Globo, 25/02 e 1º/o4/1961.

O Forum de Januária-MG

Se me lembro, o Rio Grande depois de Itutinga-MG

Talvez o Rio Grande, depois de Itutinga-MG

Idem

O mesmo

Fachadas antigas em Januária-MG

Um casarão, agora  hotel, em Januária-MG





“O mineiro é muito espectador. O mineiro é velhíssimo, é um ser reflexivo, com segundos propósitos e enrolada natureza. É uma gente imaginosa, pois que muito resistente à monotonia.

“O mineiro traz mais individualidade que personalidade. Acha que o importante é ser, e não parecer, não aceitando cavaleiro por arqueiro nem cobrindo os fatos com aparatos. Sabe que ‘agitar-se não é agir’. Sente que a vida é feita de encoberto e imprevisto, por isso aceita o paradoxo; é um idealista prático, otimista através do pessimismo.

“[O mineiro] não entra caninamente em disputas. Melhor, mesmo – não disputa. Atencioso, sua filosofia é a da cordialidade universal, sincera; mas em termos. Gregário, mas necessitando de seu tanto de solidão, e de uma área de surdina, nos contatos verdadeiramente importantes. Desconhece castas. Não tolera tiranias, sabe deslizar para fora delas. Se precisar, briga.

“[O mineiro] tem memória longa. Não tem audácias visíveis. Ele escorrega para cima. Só quer o essencial, não as cascas. Sempre freqüentado pelo enigma em pedacinhos, como quando pica seu fumo de rolo, e faz contabilidade da metafísica; gente muito apta ao reino do céu.

“[O mineiro]  não acredita que coisa alguma se resolva por um gesto ou um ato, mas aprendeu que as coisas voltas, que a vida dá muitas voltas, que tudo pode tornar a voltar. Até sem saber o que faz, o mineiro está sempre pegando com Deus”.

JOÃO GUIMARÃES ROSA, “Aí está Minas: a mineiridade”, em Revista Manchete, 24/08/1957.

Imagens: Gilson.



sexta-feira, 8 de março de 2013

saudade do futuro



Descia sempre àquele porão.

Ali guardava coisas velhas de que poderia precisar um dia (“Quem guarda tem”, lembrava do avô a sentenciar), ou objetos novos para os quais não havia ainda definido um lugar apropriado na casa. Além de ferramentas as mais diversas. Havia muitos papeis antigos também. Ele, muitas vezes, descia aquelas escadas automaticamente, sem nenhuma razão clara ou interesse manifesto. De toda forma, sentia a exigência de descer. 

Na descida daquela tarde, sentia-se especialmente movido pela comoção. Era uma tarde como tantas outras de junho, amena, de vento leve, céu cinzento. Estava sozinho em casa. Bastou que chegasse e começou a chorar. Sorvia grandes porções de ar, tentando evitar aquilo que para ele era um desatino. Assim que saiu da escada, dirigiu-se a uma pequena caixa de papelão ordinário, dentro da qual estavam os pedaços de amor guardados. Tocou, um a um, todos os objetos, apertava-os com os dedos enquanto o pensamento mudava tudo de lugar na memória. Por segurança, guardou tudo novamente na velha caixa e perguntou-se se a vida não era mesmo em senhas. Ainda lembrou-se do filme do Buñuel antes de subir correndo as escadas.
 
Na subida sentiu saudade do futuro, e ainda lembrou-se, desta vez de Manuel Bandeira, da "vida inteira que podia ter sido e que não foi”. Ou bien si peu de choses. 






domingo, 3 de março de 2013

Museu Regional de SJDR

Divulgando, porque vale muito a pena.

11ª SEMANA NACIONAL DE MUSEUS: ÚLTIMA PRORROGAÇÃO DAS INSCRIÇÕES - ATÉ 07 DE MARÇO. CONSULTE O SITE DO IBRAM WWW.MUSEUS.GOV.BR.




As informações foram encaminhadas por
Rodrigo Antunes de Souza
ASCOM – Assessoria de Imprensa
Museu Regional de São João del-Rei / IBRAM-MinC
(32) 3371-7663





terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

A pedra, o caminho e a vida






Para a Sharpei Diana.

Que eu encontre
ainda
as estrelas que não contei;
que apareça
ainda
a voz do silêncio que suportei;
que eu contemple
ainda
as pétalas voando com o vento;
que eu sinta
ainda
o frio da pedra no fundo raso do rio;
que eu ouça
ainda
o som da música viva desse fóssil sonoro que é a palavra escrita.

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

Fantasiação








E se um dia ela chegasse
Nem nada dissesse
No meu rosto tocasse...

Toda a rua paralisada
A mata toda silenciada
Ante a volta tão esperada...

Sombra e Esperança,
Gritando em alegre dança,
Seriam parte da nova aliança...

Se um dia você chegasse,
entrasse, nem nada dissesse,
no meu rosto tocasse
e meu olhar mudasse...

E se eu jamais esquecesse...

– ...?
– Hein? Não, nada.

quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

Cena na parede

Ao entregar a casa ao locador, é preciso consertar, pintar, recolocar e tirar coisas, para devolvê-la a um suposto estado de como era quando foi recebida. Ao desmontar minhas imagens nas paredes, parei todo o serviço diante da fotografia que recortei da National Geographic e colei um dia na parede. Cuidava, a bela foto, da imagem de uma criança paquistanesa numa aula de música. Ali ainda estava ela, à minha frente, pouco acima da telinha do notebook. Sentei-me na velha cadeira.

Cena na parede

Em frente de mim,
na parede eu mesmo colei
a figura do menino tocando um violino.
Ele está sentado em um banquinho comprido.

Atrás do menino aparece a partitura, num quadro verde,
da música antiga de que ninguém mais se lembrasse. Pensei.

Fui eu mesmo que plantei ali a cena:
menino, violino, partitura...
O verde do quadro e o vermelho da camisa.

Na cena, não se pode ver os olhos da criança,
que olham as cordas
– centro que move tudo em volta.

Meus próprios olhos estão girando
ao som do silêncio que criei.

Em seguida, num lance rápido, incalculado, arranquei a fotografia de lá, junto com todo o resto, embolei e joguei no cestinho que a levaria ao lixo, na rua. Restou uma parede de memória, de coisas que, se não vão embora, também não voltam mais.