segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

Seguir vivendo...





Queria ser bem velho para poder ter visto se encontrarem e chegarem juntos a Belém os três reis do Oriente. Queria ter sabido como se encontraram. Contento-me em me deixar guiar pela poesia de Sophia.


Queria ser velho, mas muito velho mesmo. Ter todas as idades para poder ter visto, em campo, jogarem Pelé e Eusébio.





Quero ser mais que velho gagá, ãhã! Quero ficar um velho gagá, caquético e repetitivo, capaz de contar a mesma estória, para a mesma pessoa, dezenas de vezes. Para pessoas diferentes, contar-se-ia às centenas. Ah, ser um ancião. Quero ser translúcido: a luz passaria por mim, sem refletir, indicando que pouco de material restava. A caquexia será de grande ajuda: dois terços do que se produz no mundo, hoje, podem ser classificados como lixo, e eu estaria quase livre de ouvir e ver isso chegar perto dos quatro quintos. Esse ranço, graças a Deus, já é sinal de que estou envelhecendo. Na verdade, sempre senti essa nostalgia do Paraíso, que um dia sei que traduzirei por sonsice de velho. Ou, talvez, poesia. Isto será meu último orgulho. A minha sonsice de velho me elevará a senhor do meu silêncio, essa centelha divina que mora em mim e que, ainda jovem, a palavra trai.

Imagens: Google
Texto: Gilson.